Livro: A fuga de Emilynne Página 2

... s a Bênção? — Porque é importante? — Devin indagou, aos soluços. — Sim, claro, mas também é um jeito de estarmos próxi¬mos dela. — Quintin sorriu para o irmão caçula. — Agora, por favor, pare de chorar. Não conseguiremos chegar ao fim da história, se você continuar a choramingar. — Está bem. — Devin enxugou o rosto com a manga do casaco. — Não vou chorar. Quintin prosseguiu: — A Bênção está na família há gerações. Nove por nove. — Mas isso não significa que ela se encerra conosco? — A pergunta ansiosa de Devin fundiu-se à atmosfera mágica que Quintin criava. — Não, seu bobo. — Bryan encarou o irmão com superiori¬dade. — Nove por nove significa oitenta e uma gerações. — Nove por nove — Quintin repetiu, ignorando o comen¬tário de Bryan. — Os Reilly estão atentos, pois lhes será entregue a grande dádiva. Um sinal de estima, uma promessa, uma prova de gratidão. As chamas do fogo iluminavam a expressão solene. — De nove por nove, você deve fazer a escolha. Somente você pode direcionar o curso para a alegria ou para a tristeza. Somente você decide se é a Bênção ou a Maldição. — Espero que a minha não seja uma maldição. — Devin estremeceu. Os mais velhos o ignoraram. — Ela pode aparecer com o trovão ou gotejar em forma de orvalho. Pode voar como um raio ou dançar ao som de uma canção. O reconhecimento depende de nós. O que fazer é a outra parte. — Sim — Bryan sussurrou. — A alegria de seu coração, a vontade de sua alma, a direção de sua vida, o caminho de sua escolha. — A escolha, uma vez feita, não pode ser desfeita — Quintin entoou. — A decisão, uma vez tomada, não pode ser alterada — Bryan e Devin replicaram em coro. — Bênção ou Maldição para todo o tempo. Os três pares de olhos verdes se marejaram. — Para todo o tempo — repetiram em uníssono. Os três se calaram. Ouvia-se somente o tiquetaque do relógio sobre o mantel ...

da lareira e a conversa dos adultos no pavimento inferior. Devin suspirou. — Ainda gostaria que vovó estivesse aqui para nos contar a lenda. Gosto do jeito como ela fala da Primeira Bênção e dos druidas. — Sim. Todos nós gostaríamos que vovó ainda estivesse conosco. —A voz de Quintin soou carregada de dor. Ele olhou para a Bíblia na mesinha ao lado da cama. — Vocês conta¬ram quantas carruagens seguiram a procissão após a missa? — A pergunta surgiu como uma tentativa para sustentar seu orgulho de menino de treze anos. — Quarenta e duas — Bryan respondeu. — Quase todos os moradores da ilha. Vovó ficaria contente. Ela pediu a papai que fechasse o estaleiro, mas não creio que ela o quisesse por três dias inteiros. — Por que papai nunca gostou de falar da Bênção? — Mais uma das perguntas prediletas de Devin chamou a atenção dos irmãos. — Ele fala sobre a Bênção — Bryan alegou. Quintin meneou a cabeça. — Só se você o obrigar. Talvez não seja prudente falar da Bênção depois que a receber. — Mas vovó falava da Bênção — protestou Devin. — Vovó era uma menina — Bryan replicou, como se tal fato explicasse tudo. —As meninas não recebem a Bênção. — Às vezes, recebem. Perguntei a ela quando Meaghan nasceu. — Vovó disse que é um evento raro. — Quintin bocejou e apagou o fogo. — É melhor irmos para a cama, antes que descubram que não estamos dormindo. Muitos anos vão se passar até que um de nós vivencie a Bênção. Eles pararam na soleira da porta e fitaram o cômodo vazio. — Boa noite, vovó — disse Bryan. — Amamos você — Devin sussurrou, choroso. — E sempre nos lembraremos. — Quintin pegou a lampari¬na e acompanhou os irmãos pelo corredor. A última brasa da lareira se apagou, deixando o quarto sob a pálida luminosidade do luar e o suave perfume de lavanda da vovó Reilly. Capítulo I Limerick, Irlanda 1858 — Estamos prontos para zarpar, ca ...

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