Livro: A dama do meu coração Página 3

... , antes de pegar uma tocha e aproximá-la do rosto empoeirado. Rosie pestanejou, rezando para que o fogo não lhe queimasse os cabelos. — Sorria, maldita, sorria! — grunhiu Quince como sempre. — Quero conseguir um bom dinheiro por você e se não me ajudar vai se arrepender amargamente. Foi preciso um esforço sobre-humano para Rosie conter a resposta empertigada que estava na ponta da língua. Sabia que seria insensato afrontá-lo. As marcas da última punição que recebera ainda es¬tavam bem vivas em suas costas. Ela respirou fundo. Uma leve tontura a assolou. Deveria ser fome, afinal, não comia nada desde a noite anterior, quando o barco em que viajavam havia aportado em Calais, depois da desconfortável viagem pelo canal. Só esperava sobreviver a esses dias na França para poder voltar a Inglaterra, se não sã e salva, pelo menos viva. Desesperada, ela tentou não pensar mais no que estava por vir. Atrás da luz anelada da tocha, podia divisar a escuridão bruxuleante da noite de verão e também milhares de fogueiras que pontilhavam o vale francês como se fossem um exército de vaga-lumes. — Desamarre a blusa dela! — gritou alguém do meio da multidão agitada. Muitos outros exigiram o mesmo: — Isto, mostre-nos o que esses panos sujos escondem! Rosie cerrou os dentes. As prostitutas que traba¬lhavam para Quince tinham lhe avisado que isto poderia acontecer, e, apesar de nunca ter passado por situação semelhante, ela sabia que as coisas só piorariam daqui por diante. Vendo-a segurar a blusa como se quisesse se de¬fender, Quince bateu-lhe novamente nas costas. — Rosie! Faça isto agora mesmo ou vai se arre¬pender de ter nascido! Os dedos trêmulos de Rosie procuraram os cordões de couro que fechavam a parte frontal da blusa, formando uma espécie de corpete que evidenciava o contorno dos seios redondos e da cintura delgada. Levou tempo demais para desatá-los, e, exasperado, Quince esticou a mão e livrou-a da blusa. A tênue ...

proteção escorregou pelos ombros e depois pelos bra¬ços de Rosie. Um gemido coletivo e bestial seguiu-se a exposição dos seios rosados e firmes. Lágrimas de humilhação marejaram os olhos de Rosie. Ela pestanejou e mordeu a língua para não deixar que um soluço agoniado escapasse-lhe dos lábios. Era difícil ser mulher e pobre nos meados do século dezesseis, mas desta vez a situação estava muito pior do que o habitual. Ao longo de seus dezenove anos, nunca se sentira tão sozinha e aban¬donada às crueldades do destino. Observando a cena a uma certa distância da mas¬sa ignóbil que gritava feito lúgubres animais no cio, sir Andrew Ford teve compaixão da pobre garota seminua que fora colocada sobre o barril. Ela piscara diversas vezes sob a iluminação incandescente da tocha e Andrew suspeitava que estivesse perto das lágrimas. A palidez do rosto e os olhos arregalados, por si só, denunciavam o quanto estava aterrorizada. No entanto, apesar da sordidez da cena, o jovem alto e forte ao lado de Andrew ria divertido. — Eu aposto que tudo não passa de encenação — Brandon Cavendish comentou com seu irmão mais jovem. — Uma virgem na tenda de um alcoviteiro?! — replicou Jack Stafford, o terceiro membro do grupo de Andrew. — Isso é tão raro quanto ver um uni¬córnio passeando pelas ruas de Londres. — Raro, mas não impossível — Andrew lembrou-o. Com elegância, levou um gatuá de flor de laran-jeira salpicado de cravos da índia até as narinas a fim de minimizar o cheiro fétido que exalava da multidão mais a frente. O banho rotineiro era uma atividade pouco praticada pelos nobres, entre os ple-beus então era ainda mais raro. Guy Cavendish, irmão de Brandon, ergueu um pouco o rosto para ver por sobre.a multidão aglo-merada alguns metros a frente. — Pois reconheço que mesmo sendo uma prosti¬tuta, ela é bonita demais para ser ignorada. Andrew olhou de soslaio para o rapaz loiro. — Como pode saber que ela é um ...

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