Livro: Noite na Taverna Página 2
Autor - Fonte: Álvares de Azevedo
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Schiller o disse, o átomo da inteligência de Platão foi
talvez pare o coração de um ser impuro. Pôr isso eu vo-lo direi: se entendeis a
imortalidade pela metempsicose, bem! talvez eu creia um pouco:—pelo
Platonismo, não!
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—Solfieri! es um insensato! o materialismo e árido como o deserto, e escuro
como um túmulo! A nos frontes queimadas pelo mormaço do sol da vida a nos
sobre cuja cabeça a velhice regelou os cabelos, essas crianças frias! A nós os
sonhos do espiritualismo!
—Archibald! deveras, que e um sonho tudo isso! No outro tempo o sonho
da minha cabeceira era o espirito puro ajoelhado no seu manto argênteo, num
oceano de aromas e luzes! Ilusões! a realidade e a febre do libertino, a taça na
mão, a lascívia nos lábios e a mulher seminua, tremula e palpitante sobre os
joelhos.
—Blasfêmia—e não crês em mais nada: teu ceticismo derribou sodas as
estatuas do teu templo, mesmo a de Deus?
—Deus! crer em Deus! sim como o grito intimo o revela nas horas frias do
medo—nas horas em que se tirita de susto e que a morte parece roçar úmida por
nos! Na jangada do naufrago, no cadafalso, no deserto —sempre banhado do suor
frio—do terror e que vem a crença em Deus! —Crer nele como a utopia do bem
absoluto, o sol da luz e do amor, muito bem! Mas se entendeis por ele os ídolos
que os homens ergueram banhados de sangue, e o fanatismo beija em sua
inanimação de mármore de há cinco mil anos! não credo nele!
—E os livros santos?
—Miséria! quando me vierdes falar em poesia eu vos direi: ai ha folhas
inspiradas pela natureza ardente daquela terra como nem Homero as sonhou—
como a humanidade inteira ajoelhada sobre os túmulos do passado nunca mais
lembrara! Mas quando me falarem em verdades religiosas, em visões santas, nos
desvarios daquele povo estúpido—eu vos direi—miséria! miséria! três vezes
miséria! Tudo aquilo e falso— mentiram como as miragens do deserto!
—E
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tas ébrio, Johann! O ateísmo e a insânia como o idealismo místico de
Schelling, o panteísmo de Spinoza o judeu, e o crente de Malebranche nos seus
sonhos da visão em Deus. A verdadeira filosofia e o epicurismo. Hume bem o
disse: o fim do homem e o prazer. Dai vede que e o elemento sensível quem
domina. E pois ergamo-nos, nos que amanhecemos nas noites desbotadas de
estudo insano, e vimos que a ciência e falsa e esquiva, que ela mente e embriaga
como um beijo de mulher.
—Bem! muito bem! e um toast de respeito!
—Quero que todos se levantem, e com a cabeça descoberta digam-no: Ao
Deus Pan da natureza, aquele que a antiguidade chamou Baeo o filho das coxas
de um deus e do amor de uma mulher, e que nos chamamos melhor pelo seu
nome—o vinho.
—Ao vinho! ao vinho!
Os copos caíram vazios na mesa.
—Agora ouvi-me, senhores! entre uma saúde e uma baforada de fumaça,
quando as cabeças queimam e os cotovelos se estendem na toalha molhada de
vinho, como os braços do carniceiro no cepo gotejaste, o que nos cabe e uma
historia sanguinolenta, um daqueles contos fantásticos—como Hoffmann os
delirava ao clarão dourado do Johannisberg!
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—Uma historia medonha, não Archibald?—falou um moco pálido que a
esse reclamo erguera a cabeça amarelenta. Pois bem, dir-vos-ei uma historia.
Mas quanto a essa, podeis tremer a gosto, podeis suar a frio da fronte grossas
bagas de terror. Não e um conto, e uma lembrança do passado.
—Solfieri! Solfieri! ai vens com teus sonhos!
—Conta!
Solfieri falou: os mais fizeram silêncio
CAPÍTULO II
SOLFIERI
— Yet one kiss on your pale clay
— And those lips once so warm beart! my bears! my bears!
BYRON—Cain
Sabei-lo. Roma e a cidade do fanatismo e da perdição: na alcova do
sacerdote dorme a gosto a amásia, no leito da vendida se pendura o Crucifixo
lívido. É um requintar de gozo blasfemo que mescla o sacrilégio a convulsão do
amor, o beijo lascivo a embriagu ...
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Comentários:
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