Livro: A Viuvinha Página 3
Autor - Fonte: José de Alencar
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por meio da pena e despertando-lhe os bons instintos pelo isolamento
e pelo silêncio?
Por que razão há de procurar-se aquilo que é contra a
natureza e desprezar-se o germe que Deus deu ao coração do
homem para regenerá-lo e purificá-lo?
Perdão, minha prima; não zombe das minhas utopias so-,:
ciais ; desculpe-me esta distração; volto ao que sou -- simples
e fiel narrador de uma pequena história.
Em amor, dois meses depressa se passam; os dias são momentos
agradáveis e as horas flores que os amantes desfolham
sorrindo.
Por fim chegou a véspera do casamento que se devia fazer
simplesmente em casa, na presença de um ou dois amigos;
o moço, fatigado dos prazeres ruidosos, fazia agora de sua felicidade
um mistério.
Nenhum dos seus conhecidos sabia de seus projetos; ocultava
o seu tesouro, com medo que lho roubassem; escondia a
flor do sentimento que tinha dentro d\'alma, receando que o bafejo
do mundo onde vivera a viesse crestar.
A noite passou-se simplesmente como as outras; apenasnotava-
se em D. Maria uma atividade que não lhe era habitual.
A boa senhora, que exigira como condição que seus dois
filhos ficassem morando com ela para alegrarem a sua solidão
e a sua viuvez, temia que alguma coisa faltasse à festa
simples e íntima que devia ter lugar no dia seguinte.
De vez em quando erguia-se e ia ver se tudo estava em
ordem, se não havia esquecido alguma coisa; e parecia-lhe que
voltava aos primeiros anos da sua infância, repassando na memória
esse dia, que uma mulher não esquece nunca.
Nele se passa o maior acontecimento de sua vida; ou realiza-
se um sonho de ventura, ou murcha para sempre uma
esperança querida que se guarda no fundo do coração; pode ser
o dia da felicidade ou da desgraça, mas é sempre uma data
notável no livro da vida.
No momento da partida, quando Jorge se levantou, D.
Maria, que compreendia o que essas duas almas tinham necessidade
de dizer-se mutuamente, retirou-se.
Os dois
...
amantes apertaram-se as mãos e olharam-se com
um desses olhares longos, fixos e ardentes que parecem embeber
a alma nos seus raios límpidos e brilhantes.
Tinham tanta coisa a dizer e não proferiram uma palavra;
foi só depois de um comprido silêncio que Jorge murmurou
quase imperceptivelmente:
-- Amanhã.
Carolina sorriu, enrubescendo; aquele amanhã exprimia
a felicidade, a realização desse belo sonho cor-de-rosa que havia
durado dois meses; a linda e inocente menina, que amava
com toda a pureza de sua alma, não tinha outra resposta.
Sorriu e corou.
Jorge desceu lentamente a ladeira e, ao quebrar a rua,
voltou-se ainda uma vez para lançar um olhar à casa.
Uma luz brilhava nas trevas entre as cortinas do quarto
de sua noiva; era a estrela do seu amor, que brevemente devia
transformar-se em Lua-de-mel.
III
DEVE fazer uma idéia, minha prima, do que será a véspera
do casamento para um homem que ama.
A alma, a vida, pousa no umbral dessa nova existência que
se abre e daí lança um volver para o passado e procura devassar
o futuro.
Aquém a liberdade, a isenção, a tranqüilidade de espírito,
que se despedem do homem; além a família, os gozos íntimos,
o lar doméstico, esse santuário das verdadeiras felicidades do
mundo que acenam de longe.
No meio de tudo isto, a dúvida e a incerteza, essas inimigas
dos prazeres humanos, vêm agitar o espírito e toldar o céu brilhante
das esperanças que sorriem.
O futuro valerá o passado?
E nessa questão louca e insensata debate-se o pensamento,
como se a prudência e sabedoria humana pudessem dar-lhe
uma solução, como se os cálculos da providência fossem capazes
de resolver o problema.
É isto pouco mais ou menos o que se passava no espírito
de Jorge, quando caminhava pela praia da Glória, seguindo
o caminho de sua casa.
Davam dez horas no momento em que o moço chegava à
rua de Matacavalos, à porta de um pequeno sobrado, onde habitava,
depois da sua retirada do ...
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