Livro: Os Timbiras Página 3
Autor - Fonte: Gonçalves Dias
...
do cadáver
Sobre a cabeça, horrivelmente belo,
Aos seus o mostra ensangüentado e torpe;
Então por vezes três o horrendo grito
Do triunfo soltou; e os seus três vezes
O mesmo grito em coro repetiram
Aquela massa enfim côa nos ares;
Porem na destra do feliz guerreiro
Dividem-se entre os dedos as melenas,
De cujo crânio marejava o sangue!
Transbordando ufania do sucesso
Inda recente, recordava as fases
Orgulhos o guerreiro! Ainda escuta
A dura voz, inda a figura avista
Desse, que ousou atravessar-lhe as sanhas:
Lembra-se! e da lembrança grato enlevo
Lhe côa n’alma em fogo: longos olhos
Em quanto assim medita, vai levando
Por onde o rio, em tortuosos giros,
Queixoso lambe as empedradas margens.
Assim o jugo seu não escorjassem
Tredos Gamelas co’a noturna fuga!
Pérfidos!o herói jurou vingar-se!
Tremei! qu’há de o valente debelar-vos!
E em quanto segue o céu, e o rio, e as selvas,
Crescem-lhe brios, força, –– alteia o colo,
Fita orgulhos a terra, onde não acha,
Nem crê achar quem lhe resista; eis nisto
Reconhece um dos seus, que pressuroso
Corre a encontra-lo, – rápido caminha;
Porém d’instante a instante, d’enfiado
Volta o pávido rosto, onde se pinta
O susto vil, que denuncia o fraco.
– Ó filho de Jaguar – de longe brada,
Neste aperto nos vale, – ei-los se avançam
Pujantes contra nós, tão bastos, tantos,
Como enredados troncos na floresta.
Tu sempre tremes, Jurucei, tornou-lhe
Com voz tranqüila e majestosa o chefe.
O mel, que em falas sem cessar distilas,
Tolhe-te o esforço e te enfraquece a vista:
Amigos são talvez, amigas tribos,
Algum chefe, que tem conosco as armas,
Em sinal d’aliança, espedaçado:
Vem talvez festejar o meu triunfo,
E os seus cantores celebrar meu nome.
“Não!não! ouvi o som triste e sonoro
Sas igaras, rompendo a custo as águas
Dos remos manejados a compasso,
E os sons guerreiros do boré, e os cantos
Do combate; parece, d\'irritado,
Tão grand
...
peso agora a flor lhe corta,
Que o rio vai sorver as altas margens”.
E são Gamelas? – perguntou-lhe o chefe.
“Vi-os, tornou-lhe Jurucei, são eles!”
O chefe dos Timbiras dentro d’alma
Sentiu ódio e vingança remorde-lo.
Rugiu a tempestade, mas lá dentro,
Cá fora retumbou, mas quase extinta.
Começa então com voz cavada e surda.
Irás tu, Jurucei, por mim dizer-lhes:
Itajubá, o valente, o rei da guerra,
Fabricador das incansáveis lutas,
Em quanto a maça não sopesa em quanto
Dormem-lhe as setas no carcaz imóveis,
Of’rece-vos liança e paz; – não ama,
Tigre repleto, espedaçar mais presas,
Nem quer dos vossos derramar mais sangue.
Três grandes Tabas, onde heróis pululam,
Tantos e mais que vós, tanto e mais bravos,
Caídas a seus pés, a voz lhe escutam.
Vós outros, atendei, – cortai nas matas
Troncos robustos e frondosas palmas,
E construí cabanas, – onde o corpo
Caiu do rei das selvas, – onde o sangue
Daquele herói, vossa perfídia atesta.
Aquela briga enfim de dois, tamanhos,
Sinalai; por que estranho caminheiro,
Amigas vendo e juntas nossas tabas,
E a fé, que usais guardar, sabendo, exclamem:
Vejo um povo de heróis e um grande chefe!
Disse: e vingando o cimo d’alto monte,
Que em roda largo espaço dominava,
O atroador membi soprou com força.
O tronco, o arbusto, a moita, a rocha, a pedra,
Convertem-se em guerreiros.-- mais depressa,
Quando soa o clarim, núncio de guerra,
Não sopra, e escava a terra, e o ar divide
Co’as crinas flutuantes, o ginete,
Impávido, orgulhoso, em campo aberto.
Da montanha Itajubá os vê sorrindo,
Galgando vales, combros, serranias,
Coalhando o ar e o céu de feios gritos.
E folga, por que os vê correr tão prestes
Aos sons do cavo búzio conhecido,
Já tantas vezes repetidos antes
Por vales e por serras; já não pode
Numera-los, de tantos que se apinham;
Mas vendo-os, reconhece o vulto e as armas
Dos seus: “Tupã sorri-se lá dos astros,
...
Comentários:
Deixe aqui seu comentário sobre este livro: