Livro: A mão e a luva
Autor - Fonte: Machado de Assis
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MINISTÉRIO DA CULTURA
Fundação Biblioteca Nacional
Departamento Nacional do Livro
A MÃO E A LUVA
Machado de Assis
I
O fim da carta
- Mas que pretendes fazer agora?
- Morrer.
- Morrer? Que idéia! Deixa-te disso, Estêvão. Não se morre por tão pouco.
- Morre-se. Quem não padece estas dores não as pode avaliar. O golpe foi profundo, e o
meu coração é pusilânime; por mais aborrecível que pareça a idéia da morte, pior, muito pior do
que ela, é a de viver. Ah! tu não sabes o que isto é?
- Sei: um namoro gorado.
- Luís!
- . E se em cada caso de namoro gorado morresse um homem, tinha já diminuído muito o
gênero humano, e Malthus perderia o latim. Anda, sobe.
Estêvão meteu a mão nos cabelos com um gesto de angústia; Luís Alves sacudiu a cabeça
e sorriu. Achavam-se os dois no corredor da casa de Luís Alves, à rua da Constituição, - que
então se chamava dos Ciganos; - então, isto é, em 1853, uma bagatela de vinte anos que lá vão,
levando talvez consigo as ilusões do leitor, e deixando-lhe em troca (usurários!) uma triste, crua e
desconsolada experiência.
Eram nove horas da noite; Luís Alves recolhia-se para casa, justamente na ocasião em que
Estêvão o ia procurar; encontraram-se à porta. Ali mesmo lhe confiou Estêvão tudo o que havia, e
que o leitor saberá daqui a pouco, caso não aborreça estas histórias de amor, velhas como Adão, e
eternas como o céu. Os dois amigos demoraram-se ainda algum tempo no corredor, um a insistir
com o outro para que subisse, o outro a teimar que queria ir morrer, tão tenazes ambos, que não
haveria meio de os vencer, se a Luís não ocorresse uma transação.
- Pois sim, disse ele, convenho em que deves morrer, mas há de ser amanhã. Cede da tua
parte, e vem passar a noite comigo. Nestas últimas horas que tens de viver na Terra dar-me-ás
uma lição de amor, que eu te pagarei com outra de filosofia.
Dizendo isto, Luís Alves travou do braço de Estêvão,
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ue não resistiu dessa vez, ou
porque a idéia da morte não se lhe houvesse entranhado deveras no cérebro, ou porque cedesse ao
doloroso gosto de falar da mulher amada, ou, o que é mais provável, por esses dois motivos
juntos. Vamos nós com eles, escada acima, até a sala de visitas, onde Luís foi beijar a mão de sua
mãe.
- Mamãe, disse ele, há de fazer-me o favor de mandar o chá ao meu quarto; o Estêvão
passa a noite comigo.
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Estêvão murmurou algumas palavras, a que tentou dar um ar de gracejo, mas que eram
fúnebres como um cipreste. Luís viu-lhe então, à luz das estearinas, alguma vermelhidão nos
olhos, e adivinhou, - não era difícil, - que houvesse chorado. Pobre rapaz! suspirou ele
mentalmente. Dali foram os dois para o quarto, que era uma vasta sala, com três camas, cadeiras
de todos os feitios, duas estantes com livros e uma secretária, - vindo a ser ao mesmo tempo,
alcova e gabinete de estudo.
O chá subiu daí a pouco. Estêvão, a muito rogo do hóspede, bebeu dois goles; acendeu um
cigarro e entrou a passear ao longo do aposento, enquanto Luís Alves, preferindo um charuto e
um sofá, acendeu o primeiro e estirou-se no segundo, cruzando beatificamente as mãos sobre o
ventre e contemplando o bico das chinelas, com aquela placidez de um homem a quem se não
gorou nenhum namoro. O silêncio não era completo; ouvia-se o rodar de carros que passavam
fora; no aposento, porém, o único rumor era dos botins de Estêvão na palhinha do chão.
Cursavam estes dois moços a academia de S. Paulo, estando Luís Alves no quarto ano e
Estêvão no terceiro. Conheceram-se na academia, e ficaram amigos íntimos, tanto quanto podiam
sê-lo dois espíritos diferentes, ou talvez por isso mesmo que o eram. Estêvão, dotado de extrema
sensibilidade, e não menor fraqueza de ânimo, afetuoso e bom, não daquela bondade varonil, que
é apanágio de uma alma forte, mas dessa outra bondade mole e de cera, que vai à mercê de tod ...
Comentários:
Larinha: Livro paia braba.
Catia Silva: Nao gostei muito do final. .
Catia Silva: Nao gostei muito do final. .
Catia Silva: Livro interessante ..
Sara: Bom.
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