Livro: Um homem inesquecível Página 2

... nto sinistro que a envolvia naquele dia. Acima da lareira, um quadro pastoril de Constable, mostrando um piquenique num claro dia de verão, parecia inadequado ao clima de pavor que permeava a casa. Ela tentou manter uma expressão calma. Por dentro, no entanto, o medo a comia viva. Suas mãos tremiam, e Rebecca procurava esquentá-las nas dobras do vestido azul-escuro. Cruzou a sala com quatro passos cuidadosamente medidos e alcançou o canapé rosa-pálido onde se acomodara o capitão Amos Brody, chefe da polícia de San Francisco. — E então? Encontrou Andrew? Ela falava devagar, tentando manter o medo sob controle. No fundo, sabia que nem era preciso perguntar. Podia adivinhar a resposta na expressão grave do policial. Se alguma coisa tivesse acontecido a Andrew. Se ele estivesse ferido ou. \\"Acalme-se. Não fique assim agitada. Andrew precisa de você\\", disse a si mesma. — Bem, Sra. Tinsdale. — Brody começou, a barriga gorda e redonda forçando a fileira dupla de botões de bronze que fechavam o uniforme azul-escuro. — Dois dos meus homens deram buscas a noite inteira. Vasculharam todos os lugares, mas não encontraram nem sombra do garoto. Sinto muito. — Continue procurando, capitão. — Ah, pode confiar em nosso trabalho — ele respondeu num tom indulgente. — Eu mesmo disse aos homens da ronda que mantenham a vigilância. Rebecca retesou o corpo. Nem ela nem Brody faziam segredo da antipatia mútua. A série de artigos sobre corrupção policial, que ela escrevera no Daily Times, levava direto ao capitão e à metade de seu departamento. Mas era Brody quem estava no comando da situação agora e, gostasse ela ou não, teria que lidar com essa realidade. — Capitão, espero que o senhor faça mais do que manter a vigilância. O que está em jogo não é um gatinho perdido que de uma hora para outra achará o caminho de casa. Trata-se. — enfatizou as palavras, como se quisesse gravá-las na mente dele — trata-se de meu filho. E ...

senhor vai me ajudar a encontrá-lo. Viu-o engolir em seco. O pomo-de-adão subiu e desceu no pescoço flácido e cheio de dobras. Encararam-se, a dama refinada e o homem ríspido, um avaliando o outro. Rebecca tinha dinheiro e editava um pequeno jornal. Isso lhe dava poder. O instinto de mãe a enchia de força e determinação. Sabia que Brody, ultimamente, vinha distribuindo o serviço aos subordinados, dizendo como e onde as coisas deviam ser feitas. Irritava-a o fato de ter que pedir-lhe ajuda. Se Brody resolvesse tratar o caso com desleixo, por causa da velha antipatia, Rebecca só ficaria sabendo disso quando fosse tarde demais. Tanto para ela como para seu único filho. A chuva respingou na cortina da janela da frente, chamando-lhe a atenção. Fios prateados de água desciam pelo vidro. Andrew estava lá fora, em algum lugar, com frio e com medo. Tinha apenas sete anos. Era tão pequeno. E tão frágil, por causa da doença que o acometera no ano anterior. Rebecca sentiu-se tomada pelo pavor. Deu um passo na direção de Brody. — Faça o que tiver de ser feito, capitão. Mande mais homens. Dez, cem. — Eu gostaria muito, Sra. Tinsdale, mas não posso. — Brody pontuou a frase com um dar de ombros negligente, que provocou a raiva de Rebecca. — Encontrar um garoto é coisa menor, comparado ao trabalho de proteger esta cidade. Meu contingente nem chega a duzentos homens, e tenho que cuidar de todos os cidadãos — concluiu num tom piedoso que, em outras circunstâncias, teria feito Rebecca rir. — De qualquer forma, enviei homens para outras áreas e. — Pouco me importam as outras áreas. — \\"Maldito bastardo\\", ela pensou enquanto se afastava, sentindo a raiva crescer. — Pouco me importam os outros cidadãos. — Virou-se de costas, os punhos cerrados, as mãos suando frio. — Não me interesso por nada e por ninguém. Só quero encontrar meu filho! Estive fora a noite toda, tentando achá-lo. Droga, capitão, espero que o senhor faça ...

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