Livro: Desejos Página 2

... se à ânsia da comunidade em querer controlar o inimigo. Afinal, ele era um ianque. Bria Hamilton imaginou por que ele supunha que ela contrataria um forasteiro. Ianque, ainda por cima. Alguém na cidade se divertira ao enviá-lo para Concord. Sem dúvida, apostas estavam sendo feitas, e a soma envolvida devia ser alta. Ocorreu-lhe que contratá-lo seria uma excelente maneira de confundir os gaiatos locais. Com um leve sorriso, considerou a hipótese tentadora, mas logo desistiu. Não fora de maneira irracional que tinha recuperado Concord. Luke piscou, espantado com a alteração nas feições dela. Por um instante, chegou a se sentir encorajado, porém logo percebeu que não era o destinatário daquele breve sorriso. Os olhos, fixos nele, mantiveram-se distantes e frios. — Sou um trabalhador enérgico e incansável. — Ele não sabia se estava repetindo a frase, pois os olhos dela — incrivelmente azuis — o desconcentravam. — O senhor já disse isso. Várias vezes. Ela observou-o mexer-se sem parar, tamborilando os dedos nos braços da cadeira. Talvez ele ficasse mais à vontade em pé, segurando o chapéu. Pelo menos teria o que fazer com as mãos. Mas não o deixaria usar a vantagem da altura contra ela. — De onde é, sr. Kincaid? — De Nova York. — A cidade? — Existe algum outro local em Nova York? — Luke deu um sorriso meio torto, que iluminou seu rosto. Bria franziu o cenho. Não esperava que ele tivesse um sorriso daquele. Momentos antes, ele parecera extremamente desconfortável, ansioso por algum sinal de consideração. Aquele sorriso, no entanto, fazia com que imaginasse se havia algo que desconhecesse acontecendo. Observou-o passar os dedos pelos cabelos castanho-escuros num gesto bem mais natural do que bater os dedos na madeira. — E o que fazia na cidade de Nova York para supor que se adaptaria numa simples fazenda de arroz na Carolina? Luke sabia que era preciso uma dose de hipocrisia para chamar Concord de "simples fa ...

enda". O local era uma das maiores propriedades rurais que haviam ficado intactas após a guerra. Não fora vendida em lotes para que os impostos fossem pagos, como muitas outras. Os Hamilton tinham encontrado uma forma de manter as terras, porém sem conservá-las em seu nome. Bria Hamilton administrava Concord, mas não a possuía. — Acredito que nada que eu tenha feito em Nova York possa interessá-la, mas eu saí de lá há muito tempo. Trabalhei em muitas fazendas de Maryland e nas grandes propriedades da Virgínia e ao redor de Raleigh. Também fui empregado em construções de Atlanta e Richmond. — Ou reconstruções? Luke notou o tom sarcástico, seguido por um olhar de arrependimento, como se a breve resposta emocional tivesse sido reveladora demais. — Pense o que quiser, mas não sou nenhum aventureiro querendo tirar proveito do infortúnio alheio. Não tenho dinheiro para investir nisso, mesmo que tivesse estômago. Bria estreitou os olhos, sem saber se poderia confiar nele. A roupa comum não sugeria ser uma pessoa de posses. Um dos botões do casaco era diferente dos outros três e fora pregado com o que parecia linha de anzol. A manga direita estava puída no punho e o colarinho brilhava de tanto ser puxado. A camisa branca e limpa estava gasta pelas lavagens excessivas. Um remendo discreto fechava um rasgo numa das pernas da calça, e os sapatos mostravam indícios da longa viagem e vestígios da tentativa de serem limpos. Lembrou-se da fisionomia de nojo com que Addie Thomas segurara o chapéu dele, que tinha a aba escurecida pelo suor, enquanto o levava até o gabinete. Não se espantaria se ela o queimasse. — Mas faço qualquer coisa com as mãos. — Ele fitou-as, e não viu o olhar assustado de Bria quando ela fez o mesmo. — Posso consertar a maior parte das coisas, e construir o que não tiver conserto. Bria afastou os olhos daquelas mãos. Ela as notara desde o começo da entrevista; eram as mãos de um homem, com as unhas qu ...

Comentários:

Deixe aqui seu comentário sobre este livro: