Livro: Último Capítulo
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Autor - Fonte: Machado de Assis
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ÚLTIMO CAPÍTULO
Há entre os suicidas um excelente costume, que é não deixar a vida sem dizer o
motivo e as circunstâncias que os armam contra ela. Os que se vão calados, raramente é por
orgulho; na maior parte dos casos ou não têm tempo, ou não sabem escrever. Costume
excelente: em primeiro lugar, é um ato de cortesia, não sendo este mundo um baile, de onde
um homem possa esgueirar-se antes do cotilhão; em segundo lugar, a imprensa recolhe e
divulga os bilhetes póstumos, e o morto vive ainda um dia ou dois, às vezes uma semana
mais.
Pois apesar da excelência do costume, era meu propósito sair calado. A razão é que,
tendo sido caipora em minha vida toda, temia que qualquer palavra última pudesse levarme
alguma complicação à eternidade. Mas um incidente de há pouco trocou-me o plano, e
retiro-me deixando, não só um escrito, mas dois. O primeiro é o meu testamento, que acabo
de compor e fechar, e está aqui em cima da mesa, ao pé da pistola carregada. O segundo é
este resumo de autobiografia. E note-se que não dou o segundo escrito senão porque é
preciso esclarecer o primeiro, que pareceria absurdo ou ininteligível, sem algum
comentário. Disponho ali que, vendidos os meus poucos livros, roupa de uso e um casebre
que possuo em Catumbi, alugado a um carpinteiro, seja o produto empregado em sapatos e
botas novas, que se distribuirão por um modo indicado, e confesso que extraordinário. Não
explicada a razão de um tal legado, arrisco a validade do testamento. Ora, a razão do legado
brotou do incidente de há pouco, e o incidente liga-se à minha vida inteira.
Chamo-me Matias Deodato de Castro e Melo, filho do sargento-mor Salvador
Deodato de Castro e Melo e de D. Maria da Soledade Pereira, ambos falecidos. Sou natural
de Corumbá, Mato Grosso; nasci em 3 de março de 1820; tenho, portanto, cinqüenta e um
anos, hoje, 3 de março de 1871.
Repito, sou um grande caipora, o mais caipora de todos os homens. Há uma
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ocução
proverbial, que eu literalmente realizei. Era em Corumbá; tinha sete para oito anos,
embalava-me na rede, à hora da sesta, em um quartinho de telha vã; a rede, ou por estar
frouxa a argola, ou por impulso demasiado violento da minha parte, desprendeu-se de uma
das paredes, e deu comigo no chão. Caí de costas; mas, assim mesmo de costas, quebrei o
nariz, porque um pedaço de telha, mal seguro, que só esperava ocasião de vir abaixo,
aproveitou a comoção e caiu também. O ferimento não foi grave nem longo; tanto que meu
pai caçoou muito comigo. O cônego Brito, de tarde, ao ir tomar guaraná conosco, soube do
episódio e citou o rifão, dizendo que era eu o primeiro que cumpria exatamente este
absurdo de cair de costas e quebrar o nariz. Nem um nem outro imaginava que o caso era
um simples início de coisas futuras.
Não me demoro em outros reveses da infância e da juventude. Quero morrer ao
meio-dia, e passa de onze horas. Além disso, mandei fora o rapaz que me serve, e ele pode
vir mais cedo, e interromper-me a execução do projeto mortal. Tivesse eu tempo, e contaria
pelo miúdo alguns episódios doloridos, entre eles, o de umas cacetadas que apanhei por
engano. Tratava-se do rival de um amigo meu, rival de amores e naturalmente rival
derrubado. O meu amigo e a dama indignaram-se com as pancadas quando souberam da
aleivosia do outro; mas aplaudiram secretamente a ilusão. Também não falo de alguns
achaques que padeci. Corro ao ponto em que meu pai, tendo sido pobre toda a vida, morreu
pobríssimo, e minha mãe não lhe sobreviveu dois meses. O cônego Brito, que acabava de
sair eleito deputado, propôs então trazer-me ao Rio de Janeiro, e veio comigo, com a idéia
de fazer-me padre; mas cinco dias depois de chegar morreu. Vão vendo a ação constante do
caiporismo.
Fiquei só, sem amigos, nem recursos, com dezesseis anos de idade. Um cônego da
Capela Imperial lembrou-se de fazer-me entrar ali de sacristão; mas, p ...
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