Livro: Armadilha do coração Página 3

... esprezava muito antes de o piloto ter dito aquelas palavras rudes. Estava acostumada a esse tipo de tratamento, do qual, na verdade, aprendera a se defender há muito tempo. — Quem se importa com que os outros possam pensar? — Elroy costumava observar. Ela se importava. No entanto, sabia como disfarçar. No instante em que entrara no helicóptero, notara que aquele homem a evitava. Na tentativa de ser amigável, havia mencionado a incrível semelhança entre ele e o rapaz que a atendera no balcão da pequena companhia aérea. — Somos gêmeos — respondera ele, sem fitá-la. Os dois irmãos tinham a mesma constituição física musculosa e a mesma beleza loira, mas os olhos do outro eram azuis e generosos. Os deste, ao contrário, mostravam-se frios e duros. Com certeza tirara conclusões precipitadas sobre Caroline. Paciência. Ela, que jamais explicara suas razões para ninguém, não começaria a fazê-lo agora. Preferira construir um muro de silêncio à sua volta. Assim, julgava-se mais protegida. Virou-se e fechou os olhos por um minuto, procurando tirar da mente a imagem de Charles. Sentia-se aborrecida por deixar-se afetar tanto por aquela presença marcante. Afinal, aquele momento pertencia somente a Elroy. Fora um bom homem, preocupado em satisfazê-la em tudo. E, apesar de Caroline ter levado muito tempo para compreender isso, o marido a salvara. Do mundo e de si mesma. Suspirou e olhou em volta. Então, era aquele o lugar que Elroy amara e onde se sentira livre. Respirando fundo o ar gelado, viu uma paisagem indomável, rústica e vazia. Para além das águas claras e onduladas, viam-se fileiras de montanhas, e em tomo do lago havia grupos de pinheiros, não muito maiores do que aqueles que Elroy usava para enfeitar a casa de campo na época do Natal. Por entre as árvores, moitas cerradas e pedras se estendiam até as margens. Caroline voltou o olhar, disfarçadamente, para o piloto. Havia uma certa rispidez nos traços viris, uma inflexib ...

lidade, algo que combinava com aquela paisagem selvagem. Uma pequena cicatriz no nariz, ossos altos e salientes, um sombreado de barba mais escuro do que o cabelo dourado, boca firme e sensual completavam-lhe a feição. Parecia ter trinta anos. Charles enfrentou aquela inspeção sem piscar. Seus olhos, azuis como as águas do lago, permaneceram duros, impiedosos. Cercados por cílios longos e escuros, tinham um brilho de aço, indicando força e teimosia. Caroline percebeu que aquele não era o tipo de homem que se conseguia ignorar. Possuía um quê misterioso e irresistível. Notavam-se ombros largos sob a camisa de flanela desbotada, cujas mangas enroladas revelavam braços musculosos, cobertos de pêlos dourados. Incrível como aquele estranho tomava suas mãos úmidas e fazia o coração bater forte. Ela fora superprotegida a vida inteira. Só freqüentara colégios femininos, e por isso mesmo sentia-se vulnerável às fortes sensações que um homem bonito despertava. Elroy a salvara de um terrível engano e dedicara-se à tarefa de tomá-la menos ingênua, aconselhando-a a nunca confiar nessas sensações. Sorriu levemente. Elroy permanecera a seu lado quando ela mais precisara de alguém, quando não tinha mais ninguém no mundo. Protegera-a quando era apenas uma jovem ingênua e romântica. Os pais de Caroline faleceram em um acidente de avião, quando ela cursava o último ano da escola. Elroy, velho amigo da família, fora nomeado o executor da considerável fortuna herdada por Caroline. Rica e inexperiente, ela pensou poder esquecer o que acontecera lançando-se à diversão. Começou a freqüentar os lugares da moda, as festas, comprou carros caríssimos. Conheceu Bill Knight, um jovem maravilhoso, entregou seu coração a ele e ficou noiva rapidamente. Ainda se sentia triste quando se lembrava daqueles olhos profundos e escuros. — Ande logo — disse o piloto, e, com movimentos bruscos, escondeu-se atrás da revista. Caroline olhou para o ...

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