Livro: Leonor de Mendonça
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Autor - Fonte: LEONOR DE MENDONÇA
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Drama em três atos e cinco quadros
1846
AO SEU BOM AMIGO
O DR. JOSÉ HERMENEGILDO XAVIER DE MORAES
oferece este seu trabalho
O AUTOR
PRÓLOGO
Contentar a todos ninguém o alcançou, muitos se
contentaram com aprazer a muitos. O autor tomará por
grande honra satisfazer a poucos.
Prol. da Com. de Bristo.
Idéias e fatos há que diariamente nos passam por diante dos olhos sem
que nunca atentemos neles; nós os reputamos coisa corrente e sabida por todos,
que por vulgar não nos pode parecer sublime. Mas sobre essa idéia ou fato, que
em a nossa memória entesouramos como substância de flores em favo de
abelhas, a reflexão trabalha sem descanso, desbasta-o, e tanto se exercita sobre
ele, que depois estranhamos de o ver brilhante, belo e muito outro do que a
princípio se nos antolhara.
Parece-nos de então que o devemos pesar e meditar com a nossa
inteligência, e ver depois as cores que nele mais sobressaem, e as roupagens que
melhor se ajeitam às suas formas. A imaginação se incumbe deste trabalho, e
desde esse instante está criada a obra artística ou literária: — edifício ou
sinfonia; estátua ou pintura; romance, ode, drama ou poema; boa ou má; perfeita
ou imperfeita —, o fato é que ela existe. Seja embora feia e falta de proporções,
será como uma criatura imperfeita, como um aborto monstruoso, como uma
anomalia mas existirá sempre.
Há, porém, entre a obra delineada e a obra já feita, um vasto abismo que
os críticos não podem ver, e que os mesmos autores dificilmente podem sondar:
há entre elas a distância que vai do ar a um sólido, do espírito à matéria. A
imaginação tem cores que se não desenham; a alma tem sentimentos que se não
exprimem; o coração tem dores superiores a toda a expressão. É por isto que aos
homens de imaginação, que não são autores, pode facilmente parecer que eles
comporiam melhor tal obra do que tal mestre, que desenvolveriam tal assunto
ou que pintariam tal paixão me
...
hor do que os outros, aliás grandes, o têm feito.
E é a razão por que eles comparam o fogo do seu coração, a viveza da sua
imaginação, a profundeza do seu sentimento (essências d’alma) com as
expressões de um autor, com palavras que, por escolhidas e delicadas que
sejam, têm sempre um — quê — de material.
É ainda por isto que eu, inimigo de quanto é ou me parece prólogo, nem
só os escrevo, como também os leio com prazer, quando eles são feitos, não
com o fim inútil de encarecer o merecimento de uma obra que já pertence à
crítica e ao público, mas para que o autor nos revele qual foi o seu pensamento,
qual a sua intenção, o que pertence exclusivamente ao autor e à arte: ao autor,
para que o público se não deixe dominar por juízes ou mal-entendidos ou malintencionados;
à arte, para que os principiantes em tal carreira não
desacoroçoem com os seus ensaios, sem dúvida imperfeitos, e não dêem de mão
às belas-letras pela desproporção que de necessidade acharão entre o seu
pensamento e a sua expressão.
Direi pois, não o que fiz, mas o que prometi fazer.
A ação do drama é a morte de Leonor de Mendonça por seu marido:
dizem os escritores do tempo que d. Jaime, induzido por falsas aparências,
matou sua mulher; dizem-no, porém, de tal maneira, que facilmente podemos
conjecturar que não foram tão falsas as aparências como eles no-las indicam. O
autor podia então escolher a verdade moral ou a verdade histórica — Leonor de
Mendonça culpada e condenada, ou Leonor de Mendonça inocente e
assassinada —. Certo que a primeira oferecia mais interesse para a cena e mais
moral para o drama; a paixão deveria então ser forte, tempestuosa e frenética,
porque fora do dever não há limite nas ações dos homens: haveria cansaço e
abatimento no amor e reações violentas para o crime, haveria uma luta tenaz e
contínua entre os sentimentos da mulher e os da esposa entre a mãe e a amante,
entre o ...
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