Livro: Surpresas do Destino Página 2

... ergonha por um instante, mas logo nova onda de dor a fez esquecer a vergonha. — Por favor. — ela suplicou, apertando os dentes. — Meu bebê está nascendo. Ajude-me. O idoso homem olhou-a com um misto de compaixão e embaraço. Depois assentiu com a cabeça. Abigail sentiu-se despida da calça molhada que usava por baixo da saia. Outra pontada nas costas a fez soltar um gemido de agonia. Por um tempo que seria impossível precisar, o instinto a fez concentrar todas as forças nos músculos do abdômen. Quando ela finalmente ergueu a parte de cima do corpo, apoiada nos cotovelos, viu que o velho embrulhava alguma coisa no próprio casaco para logo depois se afastar, saindo por uma porta estreita. Abigail voltou a apoiar a cabeça no duro banco, dominada pela exaustão. Uma onda de contentamento a envolveu. Lars ficou olhando para o bebê imóvel. Era muita coincidência o destino ter mandado até ali, num dia frio de início de primavera, duas mulheres grávidas. E era sorte delas. Se ele não houvesse atendido ao pedido do reverendo Davis para consertar a janela da igreja, as duas não encontrariam ninguém e provavelmente morreriam. Como havia morrido a primeira, embora deixando vivo o filho. Rasgando uma parte da única camisa boa que possuía, Lars enrolou a menina morta. A mulher lá fora certamente queria uma explicação, mas o que dizer a ela? Como explicar que a criancinha morrera sem ao menos respirar pela primeira vez? O berro saudável do faminto menino recém-nascido soou na igreja silenciosa. Lars olhou para o outro bebê, acomodado na pequena caixa de madeira. Mal havia chegado ao mundo, aquele pobrezinho se tornara órfão. Era uma ironia do destino: um filho sem mãe e uma mãe sem filho. Abatido, Lars dirigiu o olhar para o corpo sem vida da mulher, que continuava no mesmo local onde havia exalado o último suspiro, sobre um banco ainda inacabado. Quando ele foi cobrir o rosto pálido da morta com um lençol, viu em volta do pescoço ...

ela uma fina corrente de ouro. A medalha circular pendurada na corrente mostrava um estranho símbolo, um dragão chinês empinado sobre as pernas traseiras. Aquela mulher morrera durante o parto, sem ao menos dizer quem era ou de onde viera. Agora, Lars estava impossibilitado de encontrar o parente mais próximo do menino órfão. O recém-nascido recomeçou a gritar. A mulher que ficara esperando no banco da igreja chamou pela criança que não sabia estar morta. Lars encolheu-se, aflito. Precisava fazer alguma coisa. Caindo de joelhos ao lado da mulher sem vida, ele fez uma breve oração pela alma dela. Um minuto mais tarde, levantou-se e enfiou no bolso a corrente de ouro com a medalha. Depois de ficar olhando alternadamente para os corpos da menina e da mulher, tomou uma decisão ditada pelo desespero. Pegou o robusto recém-nascido e enrolou-o no cobertor já separado para esse fim. Sabia que o que iria fazer não era direito, mas que outra chance de sobrevivência aquela criança teria numa terra cheia de homens que só pensavam em encontrar ouro e prata? A mulher ainda deitada no banco suspirou de alívio, quando o viu retornando. — É o meu bebê? Ele está bem? Sem responder, Lars entregou-lhe o bebê embrulhado. Recebendo o choroso menino, ela ergueu com a mão trêmula uma das pontas do cobertor para ver pela primeira vez o rosto do filho. — É um menino — disse Lars, com voz áspera. Lágrimas de amargura escorreram dos olhos de Abigail. Carl jamais saberia que tinha um filho bonito e saudável para honrar o nome dele. — Matthew. Vou chamá-lo de Matthew — ela disse, passando a ponta do dedo na bochecha rosada do menino. — Olá, Matthew Cooprel. Bem-vindo ao mundo. O bebê ergueu as pálpebras e olhou para ela. Os olhos eram azuis como o céu. Abigail deu graças a Deus por ter um filho saudável para amar e alimentar. Lars sentia uma onda de culpa cada vez que a mulher dizia uma palavra carinhosa ao recém-nascido. Ela estav ...

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