Livro: Tu só tu puro amor Página 2
Autor - Fonte: Machado de Assis
...
tos dele, alguns dos
quais são sublimes, aquele, por exemplo:
De amor escrevo, de amor trato e vivo.
ou este:
Tanto do meu estado me acho incerto.
Sabeis a continuação?
CAM. Até lhe sei o fim:
Se me pergunta alguém por que assim ando
Respondo que não sei, porém suspeito
Que só porque vos vi, minha senhora.
(Fitando-lhe muito os olhos.) Esta senhora. Sabeis vós, decerto, quem é esta senhora do
poeta como eu o sei como o sabem todos. Naturalmente amam-se ainda muito?.
D. MAN. (à parte). Que quererá ele?
CAM. Amam-se por força.
D. MAN. Cuido que não.
CAM. Que não?
D. MAN. Acabou como tudo acaba.
CAM. (sorrindo). Andai lá; não sei se me dizeis tudo. Amigos sois e não é impossível que
também vós. Onde está a
nossa gentil senhora D. Francisca de Aragão?
D. MAN. Que tem?
CAM. Vede: um simples nome vos faz estremecer de cólera. Mas, abrandai a cólera, que
não sou vosso inimigo, mui ao contrário; amo-vos, e a ela também. e respeito-a muito.
Um para o outro nascestes. Mas, adeus, faz-se tarde, vou ter com El-rei. (Sai pela direita).
CENA II
D. MANUEL DE PORTUGAL
Este homem! Este homem!. Como se os versos dele, duros e insossos. (Vai à porta por
onde Caminha saiu, e
levanta o reposteiro.) Lá vai ele; vai cabisbaixo; rumina talvez alguma cousa. Que não
sejam versos (Ao fundo aparecem D. Antônio de Lima e D. Catarina de Ataíde).
CENA III
D. MANUEL DE PORTUGAI, D. CATARINA DE ATAIDE, D. ANTÔNIO DE LIMA
D. ANT. Que espreitais aí, senhor D. Manuel?
D. MAN. Estava a ver o porte elegante de nosso Caminha. Não vades supor que era
alguma dama. (Levanta o reposteiro.) Olhai, lá vai ele a desaparecer. Vai a El-rei.
D. ANT. Também eu. Tu, não, minha boa Catarina. A rainha espera-vos. (D. CATARINA
faz uma reverência e caminha para a porta da esquerda.) Ide, ide, minha gentil flor. (A D.
MANUEL) Gentil, não a achais?
D. MAN. Gentilíssima.
D. ANT. Agradecei, Catarina.
D. CAT. Agradeço; mas o certo é que o Se
...
hor D. Manuel é rico de louvores.
D. MAN. Eu podia dizer que a natureza é que foi convosco pródiga de graças; mas, não
digo; seria repetir mal aquilo que só poetas podem dizer bem. (D. ANTÔNIO fecha o
rosto.) Dizem que também sou poeta, é verdade; não sei; faço versos. Adeus, Senhor D.
Antônio. ( Corteja-os e sai. D. CATARINA vai a entrar, à esquerda. D. ANTÔNIO detémna.)
CENA IV
D. ANTÔNIO DE LIMA, D. CATARINA DE ATAIDE
D. ANT. Ouviste aquilo?
D. CAT. (parando). Aquilo?
D. ANT. \\"Que só poetas podem dizer bem\\" foram as palavras dele. (D. CATARINA
aproxima-se.) Vês tu, filha? Tão
divulgadas andam já essas cousas, que até se dizem nas barbas de teu pai!
D. CAT. Senhor, um gracejo.
D. ANT. (enfadando-se). Um gracejo injurioso, que eu não consinto, que não quero, que
me dói. \\"Que só poetas podem dizer bem!\\" E que poeta! Pergunta ao nosso Caminha o
que é esse atrevido, o que vale a sua poesia. Mas, que seja outra e melhor, não a quero
para mim, nem para ti. Não te criei para entregar-te às mãos do primeiro que passa, e lhe
dá na cabeça haver-te.
D. CAT. (procurando moderá-lo). Meu pai.
D. ANT. Teu pai, e teu senhor!
D. CAT. Meu senhor e pai. juro-vos que. juro-vos que vos quero e muito. Por quem
sois, não vos irriteis contra mim!
D. ANT. Jura que me obedecerás.
D. CAT. Não é essa a minha obrigação?
D. ANT. Obrigação é, e a mais grave de todas. Olha-me bem filha; eu amo-te como pai
que sou. Agora, anda, vai.
CENA V
D. ANTÔNIO DE LIMA, D. CATARINA DE ATAIDE, D. FRANCISCA DE ARAGÃO
D. ANT. Mas não, não vás sem falar à senhora D. Francisca de Aragão, que aí nos
aparece, fresca como a rosa que desabotoou agora mesmo, ou como dizia a farsa do
nosso Gil Vicente, que eu ouvi há tantos anos, por tempo do nosso
sereníssimo Senhor D. Manuel. Velho estou, minha formosa dama.
D. FRA. E que dizia a farsa?
D. ANT A farsa dizia:
É bonita como estrela,
Uma rosinha de abril,
Uma frescura de m ...
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