Livro: Outras Poesias Página 2
Autor - Fonte: Augusto dos Anjos
...
hás de crescer, no teu silêncio, tanto
Que, é natura, ainda algum dia, o pranto
Das tuas concreções plásmicas flua!
A água, em conjugação com a terra nua,
Vence o granito, deprimindo-º. O espanto
Convulsiona os espíritos, e, entanto,
Teu desenvolvimento continua!
Antes, geléia humana, não progridas
E em retrogradações indefinidas,
Volvas à antiga inexistência calma!.
Antes o Nada, oh! gérmen, que ainda haveres
De atingir, como gérmen de outros seres,
Ao supremo infortúnio de ser alma!
NATUREZA ÍNTIMA
Ao filósofo Farias Brito
Cansada de observar-se na corrente
Que os acontecimentos refletia,
Reconcentrando-se em si mesma, um dia,
A Natureza olhou-se interiormente!
Baldada introspecção! Noumenalmente
O que Ela, em realidade, ainda sentia
Era a mesma imortal monotonia
De sua face externa indiferente!
E a Natureza disse com desgosto:
"Terei somente, porventura, rosto?!
"Serei apenas mera crusta espessa?"
"Pois é possível que Eu, causa do Mundo,
"Quanto mais em mim mesma me aprofundo,
"Menos interiormente me conheça?!"
A FLORESTA
Em vão com o mundo da floresta privas!.
-- Todas as hermenêuticas sondagens,
Ante o hieróglifo e o enigma das folhagens,
São absolutamente negativas!
Araucárias, traçando arcos de ogivas,
Bracejamentos de álamos selvagens,
Como um convite para estranhas viagens,
Tornam todas as almas pensativas!
Há uma força vencida nesse mundo!
Todo o organismo florestal profundo
É dor viva, trancada num disfarce.
Vivem só, nele, os elementos broncos,
-- As ambições que se fizeram troncos,
Porque nunca puderam realizar-se!
A MERETRIZ
A rua dos destinos desgraçados
Faz medo. O Vício estruge. Ouvem-se os brados
Da danação carnal. Lúbrica, à lua,
Na sodomia das mais negras bodas
Desarticula-se, em coréias doudas,
Uma mulher completamente nua!
É a meretriz que, de cabelos ruivos,
Bramando, ébria e lasciva, hórridos uivos
Na mesma esteira pública, recebe,
Entre
...
arraparias e esplendores,
O eretismo das classes superiores
e o orgasmo bastardíssimo da plebe!
É ela que, aliando, à luz do olhar protervo,
O indumento vilíssimo do servo
Ao brilho da augustal toga pretexta,
Sente, alta noite, em contorções sombrias,
Na vacuidade das entranhas frias
o esgotamento intrínseco da besta!
É ela que, hirta, a arquivar credos desfeitos,
Com as mãos chagadas, espremendo os peitos,
Reduzidos, por fim, a âmbulas moles,
Sofre em cada molécula a angústia alta
De haver secado, como o estepe, à falta
Da água criadora que alimenta as proles!
É ela que, arremessada sobre o rude
Despenhadeiro da decrepitude,
Na vizinhança aziaga dos ossuários
Representa, através os meus sentidos,
A escuridão dos gineceus falidos
E a desgraça de todos os ovários!
Irrita-se-lhe a carne à meia-noite.
Espicaça-a a ignomínia, excita-a o açoite
Do incêndio que lhe inflama a língua espúria.
E a mulher, funcionária dos instintos,
Com a roupa amarfanhada e os beiços tintos,
Gene instintivamente de luxúria!
Navio para o qual todos os portos
Estão fechados, urna de ovos mortos,
Chão de onde uma só planta não rebenta,
Ei-la, de bruços, bêbeda de gozo
Saciando o geotropismo pavoroso
De unir o corpo à terra famulenta!
Nesse espolinhamento repugnante
O esqueleto irritado da bacante
Estrala. Lembra o ruído harto azorrague
A vergastar ásperos dorsos grossos.
E é aterradora essa alegria de ossos
Pedindo ao sensualismo que os esmague!
É o pseudo-regozijo dos eunucos
Por natureza, dos que são caducos
Desde que a Mãe-Comum lhes deu início.
É a dor profunda da incapacidade
Que, pela própria hereditariedade
A lei da seleção disfarça em Vício!
É o júbilo aparente da alma quase
A eclipsar-se, no horror da ocídua fase
Esterilizadora de órgãos. É o hino
Da matéria incapaz, filha do inferno,
Pagando com volúpia o crime eterno
De não ter sido fiel ao seu destino! –
É o Desespero q ...
Warning: Undefined global variable $_POST in
/home4/mult6346/multiajudaromances.com.br/livro.php on line
252
Comentários:
Warning: Undefined global variable $_POST in
/home4/mult6346/multiajudaromances.com.br/livro.php on line
258
Warning: Trying to access array offset on value of type null in
/home4/mult6346/multiajudaromances.com.br/livro.php on line
258
Deixe aqui seu comentário sobre este livro: