Livro: A Rosa de Seda Página 2

... , além de médico da família há muitos anos. Descartando a sugestão da filha, ele continuou a caminhar. Quando chegaram em casa, a brancura do rosto cedera lugar a uma cor mais sadia e a dor passara. — Está melhor, papai? — Não se preocupe tanto com este velho aqui. Tenho me vi¬rado bem desde que você me abandonou — Guy respondeu, dando um beijo na testa da filha. Tiny despediu-se desejando uma boa noite e subiu para o quarto. Que exagero considerar sua ida para a faculdade como aban¬dono de lar! De fato, a experiência tinha se revelado mais enriquecedora do que havia imaginado, mas nem por isso per¬dera totalmente os laços com o lugar onde passara a infância. Crescera solitária e presa ao haras; os treinadores, cavalariços e jóqueis eram as únicas pessoas com quem mantinha contato. O fluxo incessante de visitantes pouco tinha contribuído para quebrar a monotonia ou para o estabelecimento de novas amizades, pois ninguém ousava dirigir mais que um cumprimento educado à filha de Guy Ryan, já que todos sabiam do zelo e da superproteção que ele dedicava a ela. Sean Murphy, um irlandês de porte gigantesco e rosto cas¬tigado pelo peso dos anos e pelo trabalho árduo, vivia no Haras Ryan há vinte e seis anos. Além de empregado dedicado, como chefe dos treinadores, era amigo leal de Guy e padrinho de Tiny. Ele a tinha ensinado a cavalgar aos seis anos de idade, a dançar aos treze e a compreender melhor o homem, muitas vezes difícil, que era seu pai. Criada naquele lugar resguardado do mundo, ela havia des¬coberto um novo sentido de liberdade ao ir estudar longe dali. Quando entrou em seu antigo quarto, sentiu-se tomada por uma espécie de felicidade com a idéia de que partiria no dia seguinte, de volta para a escola e para o dormitório funcional, muito di¬ferente daquele que mais parecia o de um conto de fadas. Nada havia mudado ali: a delicada mobília branca com detalhes dou¬rados se assentava sobre um tapete igualmente bran ...

o, e um dossel com franjas se erguia sobre a cama. Apenas o cor-de-rosa da cortina e da colcha havia mudado com o tempo, tomando uma tonalidade escurecida. Sentindo frio, tirou a roupa depressa e vestiu uma camisola de flanela. Então, a fotografia que adornava a cômoda desde sua infância chamou-lhe a atenção. Sentiu-se emocionada ao olhar a mulher de quem havia herdado a pequena estatura e as feições delicadas. Anne Ryan transmitia serenidade através dos olhos castanhos. Apesar de vagas, as lembranças da mãe, que morrera quando Tiny contava apenas três anos, ainda provocavam emoções intensas. Mesmo depois de passado tanto tempo, Guy não con¬seguia falar sobre a falecida esposa sem ser tomado de emoção, e muito do que Tiny sabia sobre a mãe se devia aos relatos de Sean Murphy. “Uma dama. Muito inteligente. Muito sensata”, ele costu¬mava dizer de Anne Ryan, num tom de profunda admiração e respeito. Consciente de ter herdado a racionalidade da mãe, Tiny fi¬cava muitas vezes imaginando como a “sensata” Anne havia lidado com o simpático visionário com quem se casara. “Ela acreditava em seu pai e sempre o apoiava”, as palavras de Sean voltavam-lhe à mente, Tiny sorriu para a fotografia. A tristeza de não ter conhecido a mãe era compensada pela certeza intuitiva de que Anne Ryan compreenderia sua necessidade de uma vida que extrapolasse os limites do mundo de criação e corrida de cavalos. Do lado de fora do velho casarão, o vento assobiava forte. Após um longo tempo de vigília em companhia do pai, à espera do nascimento do cavalinho, ela adormeceu rapidamente. Na manhã seguinte, ao acordar, Tiny mal continha a ansie¬dade de voltar à Escola Superior de Louisville e reiniciar as aulas, no dia seguinte. Cursava o segundo ano de artes, mas ainda estava incerta quanto ao tipo de carreira que pretendia seguir após a graduação. Gostava de estudar e tirava notas boas. A vida no campus era animada, e ela fizera muitos ami ...

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