Livro: Além do paraíso Página 4

... com orgulho voraz. — E o que a possibilitou ser uma das únicas mulheres oci¬dentais a falar um kharastani fluente. Ora, você fala quase tão fluentemente quanto eu! — Obrigada. — Sorrel se curvou rápido, sabendo que o sheik acabara de lhe fazer um elogio e não re¬conhecê-lo seria descortês. Mas isso também era um exemplo do quanto as coisas haviam mudado desde sua elevação na hierarquia real. Houve uma época em que ela o teria provocado de forma brincalhona, ou talvez o desafiasse sobre quem estava certo, ou errado. Não mais. E quanto mais tempo você ficar, pior será, disse a si mesma. — Eu não quero ser uma estranha em minha terra natal, Malik — falou ela, com fervor. — E se eu dei¬xar passar muito mais tempo, serei. Eu me tornarei uma daquelas pessoas cujo conhecimento a respeito de seu próprio país limita-se a vagas lembranças. Os olhos dele cintilaram ao balançar a cabeça. — Sim — cedeu ele. — Os laços à nossa terra na¬tal são os instintos mais fortes conhecidos de um ho-mem, pois eles nos ligam à nossa própria história. Sorrel ficou com tanta raiva que seria capaz de chutar a perna da escrivaninha. Queria lhe dizer para não ser tão irritantemente pomposo, mas ela também não podia fazer isso. Ele podia falar com ela como se tivesse 103 anos de idade, mas o que dizia fazia sen¬tido e, ao menos, falava de coração. A descendência era de imensa importância para ele. Por isso, ele en¬tenderia naturalmente que ela também quisesse in¬vestigar suas próprias raízes. Afinal, não era culpa dele que ao longo dos anos ela tivesse alimentado uma fantasia tola quanto compartilharem um futuro. — Sorrel? A voz dele irrompeu em seus pensamentos e Sorrel piscou, com o coração disparando como aconte¬cia, quando ele pronunciava seu nome daquela forma tão meiga. — Sim, Malik? — O que exatamente você está pensando em fazer na Inglaterra? Tentar começar uma vida nova. Fazer o que toda mulher de 25 ano ...

já teria feito, a essa altura, caso não estivesse tão envolvida, tentando se encaixar num lugar onde não pertence. Talvez encontrar um namorado no caminho. — Vou procurar um emprego. Houve uma pausa. — Um emprego? Que tipo de emprego? — per¬guntou ele, exigente, incrédulo, como se ela tivesse falado algo surreal. — Posso fazer muitas coisas. — É mesmo? — Ele se recostou na cadeira e entre¬laçou os dedos longos sobre a túnica de seda, com um olhar negro perfurante. — Tais como? — Sou ótima administradora. — Até aí é verdade — admitiu ele, pois ela vinha coordenando as atividades do palácio desde que se formara. Nenhum banquete real jamais fora concluí¬do sem que Sorrel estivesse nos bastidores coman-dando a engrenagem do evento, evitando que egos delicados se chocassem. — E também sou bem articulada e tenho diplomacia. Malik estava vendo o rumo da conversa e lembrou a si mesmo o quanto ela era protegida e inocente. — Se acha que poderá ingressar diretametite num emprego sem qualquer treinamento está enganada, Sorrel, — Altivo, ele tamborilava um dedo sobre a superfície polida da escrivaninha. — Entretanto, eu posso falar com algumas pessoas em seu nome. Tal¬vez eu possa providenciar para que fique com uma família. Sim, isso pode ser a melhor solução à vista. — Uma família? — Por que não? As garotas sempre fazem isso. Garotas, ele havia dito. Não mulheres, mas garo¬tas. Aquilo já era demais! Pela primeira vez, depois de adulta, Sorrel olhou ao redor daquele cômodo do palácio de teto alto, não como um lugar mobiliado com antiguidades inestimáveis e lustres cintilantes, mas como um tipo de gaiola de luxo. Exceto pelo fato de que até mesmo um passarinho preso numa gaiola podia ser visto, enquanto ela ficava escondida, como um tipo de segredo. Impedida de se relacionar livre¬mente com homens, coberta dos pés à cabeça com ro¬bes desenhados para ocultar sua silhueta de todos os olhos. Ela ...

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