Livro: Noite sobre o Nilo Página 2

... a pequena caverna. Era quente, escura e sufocante, mas o que importava? O fato era que ela existia. Estava ali, exatamente onde ele sempre imaginou que estivesse. A cortina de pedra que protegia a entrada deixava lá fora o brilho do sol do deserto. Charlie abaixou-se o máximo que pôde, para evitar que a cabeça batesse nas rochas pontiagudas do teto, e acendeu a lanterna. A primeira coisa que verificou foi que as paredes rochosas apresentavam um sem-número de outras fendas, todas estreitas. Suspirou ligeiramente desanimado, e ficou parado por alguns minutos, pensando no que deveria fazer. E concluiu que não lhe restava escolha senão procurar o que buscava dentro de cada aberturazinha pedregosa. Naquele momento, sequer se lembrou da existência de cobras e escorpiões, tão comuns num lugar assim. Na verdade, esquece-se de todas as precauções que prometera tomar desde que chegara ao Egito. Começou a procurar na parede da direita e, depois de alguns minutos, desistiu. Não havia nada lá. Por um instante as dúvidas o assaltaram perversas. E se sua busca fosse em vão? E se Ford tivesse razão? E se estivesse arriscando sua reputação profissional, para não dizer a própria vida, por nada? Tratou de afastar esses pensamentos pessimistas da cabeça. Essa hipótese não devia ser levada em conta. Uma tragédia dessas não podia acontecer. Ele não sabia bem por que, mas alguma coisa lhe dizia que estava perto daquilo que já considerava o maior tesouro de todos os tempos. Era uma intuição forte, quase uma sabedoria antiga presente, sabe-se lá como, nas profundezas de sua mente. Charlie sentia as pedras ferirem seus dedos. Alguns chegavam a sangrar. Apoiado nos tornozelos, ele continuava a busca frenética. Recusava-se a perder as esperanças. Aquilo simplesmente não podia dar errado. Uma vida inteira de pesquisas sérias estava em jogo. Deitou-se, para poder usar as duas mãos. Então, minutos depois, quase que por milagre, a esquerda tocou em algum ...

coisa lisa, feita de metal e pedras polidas. Ele se deteve, a respiração suspensa, o coração disparado. Se estivesse certo, ali se encontrava a maior descoberta da história da arqueologia. Um verdadeiro achado, que lhe daria um lugar entre os maiores arqueólogos do mundo: Carter, Belgoni, Harris. Trêmulo, ofegante, ele tirou o objeto do pequeno buraco onde ficara escondido por milhares de anos. Olhou para a caixa com um respeito que se aproximava da reverência. Analisou-a demoradamente. O porta-jóias, feito de ouro puro com incrustações de pedras preciosas, brilhava diante de seus olhos. Ele sabia que aquele era o seu tesouro. A caixa mística onde descansava uma das mãos do deus Osíris. De acordo com a mitologia egípcia, sua esposa, a deusa Isis, mandara confeccionar aquela mão de ouro para dar vida eterna ao marido morto. Aquele pequeno objeto, dizia a lenda, o tornaria capaz de reviver num outro mundo. Durante séculos os egípcios deixaram-se cativar por aquela história, prova irrefutável do amor eterno e de seu poder de renovação. Mas uma seita de fanáticos, em pleno final do século 20, estava tentando mostrar que a ressurreição era possível. Eles acreditavam que, usando objetos autênticos e encantamentos apropriados, seria possível fazer com que os mortos ressuscitassem. Charlie sempre se sentira atraído pelo mito de Osíris. Mas não fora isso o que o levara até aquele lugar. Estava ali graças a um trabalho árduo, que consumira anos e anos de pesquisas. Para realizá-las, ele estudara profundamente a mitologia egípcia, lera todas as histórias, ouvira todos os relatos que as pessoas tinham para contar. Ford, cético como sempre, ficaria atônito com a descoberta daquele porta-jóias. E Olívia haveria de se orgulhar muito dele. Por um breve momento Charlie se sentiu tão tomado pela emoção que não conseguiu parar de tremer. Então se deu conta de algo terrível: não era seu corpo que tremia. Era o solo. Um estrondo ...

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