Livro: História do Futuro Vol. I Página 4
Autor - Fonte: Padre Antônio Vieira
...
nores
antigas e passadas, se leram sempre com gosto, e depois de sabidas se tornaram a
ler sem fastio, confiança nos fica para esperar que não será ingrato aos leitores este
nosso trabalho, e que será tão deleitosa ao gosto e ao juízo a História do Futuro,
quanto é estranho ao papel o assunto e nome dela.
Mas porque não cuide alguma curiosidade crítica que o nome do futuro não
concorda nem se ajusta nem com o título de história, saiba que nos pareceu chamar
assim à esta nossa escritura, porque, sendo novo e inaudito o argumento dela,
também lhe era devido nome novo e não ouvido.
Escreveu Moisés a história do princípio e criação do Mundo, ignorada até
aquele tempo de quase todos os homens. E com que espírito a escreveu?
Respondem todos os Padres e Doutores que com espírito de profecia. Se já no
Mundo houve um profeta do passado, porque não haverá um historiador do futuro?
Os profetas não chamaram história às suas profecias, porque não guardam nelas
estilo nem leis de histórias: não distinguem os tempos, não assinalam os lugares,
não individuam as pessoas, não seguem a ordem dos casos e dos sucessos, e
quando tudo isto viram e tudo disseram, é envolto em metáforas, disfarçado em
figuras, escurecido com enigmas e contado ou cantado em frases próprias do
espírito e estilo profético, mais acomodadas à majestade e admiração dos mistérios,
que à notícia e inteligência deles.
Do profeta Isaías, que falou com maior ordem e maior clareza, disseram S.
Jerônimo e Santo Agostinho que mais escrevera história que profecia. A sua profecia
é o Evangelho fechado; o Evangelho é a sua profecia aberta. E porque nós, em tudo
o que escrevemos, determinamos observar religiosa e pontualmente todas as leis da
história, seguindo em estilo claro e que todos possam perceber, a ordem e sucessão
das cousas, não nua e secamente, senão vestidas e acompanhadas das suas
circunstancias; e porque havemos de distinguir
...
empos e anos, sinalar províncias e
cidades, nomear nações e ainda pessoas, (quando o sofrer a matéria), por isso, sem
ambição nem injúria de ambos os nomes, chamamos a esta narração História e
História do Futuro.
Sós e solitariamente entramos nela (mais ainda que Noé no meio do dilúvio)
sem companheiro nem guia, sem estrela nem farol, sem exemplar nem exemplo. O
mar é imenso, as ondas confusas, as nuvens espessas, a noite escuríssima; mas
esperamos no Pai dos lumes (a cuja glória e de seu Filho servimos), tirará a
salvamento a frágil barquinha: ela com maior ventura que Argos, e nós com maior
ousadia que Tífis.
Antes de abrir as velas ao vento (oh faça Deus que não seja tempestade!),
em lugar da benevolência que se costuma pedir aos leitores, só lhes quero pedir
justiça. É de direito natural que ninguém seja condenado sem ser ouvido; isto só
deseja e pede a todos a nova História do Futuro, com palavras não suas, mas de S.
Jerônimo: Legant prius et postea despiciant: «Leiam primeiro, e depois condenem»
— assim dizia aquele grande mestre da Igreja, defendendo a sua versão dos
sagrados Livros, então perseguida e impugnada, hoje adorada e de fé.
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CAPÍTULO II
Segunda parte do titulo desta História; convidam-se os Portugueses à lição
dela.
No capítulo passado falamos com todo o Mundo; neste só com Portugal.
Naquele prometemos grandes futuros ao desejo; neste asseguramos breves desejos
ao futuro. Nem todos os futuros são para desejar, porque há muitos futuros para
temer. «Amanhã serás comigo», disse Samuel a Saul, o profeta ao rei, o morto ao
vivo. Oh que temeroso futuro! Caiu Saul desmaiado, e fora melhor cair em si que aos
pés do Profeta. Mas era já a véspera do dia da morte; e quem busca o desengano
tarde, não se desengana. Outros reis houve, que por não temer os futuros, quiseram
antes ignorá-los.
.Cessant oracula Delphis,
Sed siluit postquam reges timuere futur ...
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Comentários:
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